Santana do Paraíba, uma verdadeira cidade
Assim como se diz que o Brás é a terceira cidade brasileira, pode-se afirmar que Santana do Paraíba é a sexta ou sétima cidade Valeparaibana.
Pertencendo embora a São José dos Campos, de cujo município é parte integrante, o distrito de Santana, por motivos de ordem legal, tem que se contentar com ser apenas distrito… Nem mesmo uma subprefeitura pode ser, por inconstitucionalidade.
Santana é um apêndice de São José, ao qual é ligada pela avenida Ruy Barbosa e vias transversais, de sorte que o casario praticamente não sofre solução de continuidade, estendendo-se por mais de dois quilômetros, na baixada, rumo ao Paraíba, em cujas margens se situa o próspero bairro.
Houvesse, entre a cidade propriamente dita e o distrito em questão, maior distância, e a estas horas Santana seria um dos adiantados municípios bandeirantes, desmembrado da sede, por uma questão de justiça.
Uma verdadeira cidade
Santana do Paraíba tem tudo para ser uma cidade. É um aglomerado de 11 mil habitantes. Sede de uma paroquia, tem uma igreja matriz de linhas modernas e imponentes. Conta com cinema de recente construção, três clubes com praças de esportes. A Associação Atlética Santana tem sua sede, um prédio de três andares, de sua propriedade. Há na vila dois grupos escolares oficiais e um edifício destinado ao terceiro grupo, localizado junto a uma das industrias e que é, no seu gênero, dos mais completos da zona. Nada menos de trinta e seis classes escolares funcionam ali.
A arrecadação municipal é estimada em cinco milhões de cruzeiros, maior que a renda de muitos municípios.
No distrito ficam localizadas importantes fábricas, como a tecelagem, uma de moveis artísticos, duas de louça, uma de raion, uma cooperativa de laticínios, três beneficiadoras de arroz, uma de café. Só a firma Irmãos Prianti beneficiou, este ano, 24 mil sacas de arroz.
Outras indústrias menores elevam a produção, neste setor, a um total de 300 milhões de cruzeiros anuais.
O comércio é dos mais prósperos, ali situando-se os principais estabelecimentos de cereais e atacadistas.
As ruas são calçadas, faltando concluir-se um trecho da avenida Ruy Barbosa, que desta forma ficará pavimentada em toda a sua extensão, até o viaduto da Central do Brasil, cujos trilhos constituem a linha divisória entre Santana do Paraíba e a cidade de São José dos Campos.
Situada, como dissemos, junto ao Paraíba, tem Santana, em seus domínios, um dos únicos clubes de pesca da região o Piraquara Clube organização de elite, que está construindo. sua sede própria, com piscina e outros melhoramentos.
Para que essa cidade gêmea de São José seja, ainda, mais completa, não lhe falta nem mesmo uma necrópole. Lá está o cemitério da Paz, inaugurado há uns 15 anos.
Vinte receptores de televisão completam o quadro de progresso de Santana, que não é uma zona apenas modesta, pois dispõe de residências modernas e luxuosas, também.
Obra social
A nova igreja de Santana é obra do Pe. Luiz Gonzaga Cavalheiro. A ele se deve, também, a iniciativa de uma instituição beneficente, destinada a grandes serviços. Referimo-nos à Obra de Assistência Social Pio XII, que já construiu, devendo em breve inaugurar, uma maternidade, em que já se empregaram mais de um milhão e quinhentos mil cruzeiros.
Além da maternidade a Obra prevê a edificação de um centro de puericultura e um berçário, objetivos de cuja consecução ninguém duvida, diante da capacidade de realização e tenacidade do padre Cavalheiro.
Com as autoridades
Santana do Paraíba, que dispõe de cartório de paz, agência postal, subcentro de saúde, estação arrecadadora de impostos municipais, comporta uma coletoria federal. Não vemos inconveniente em que se crie mais uma coletoria em São José dos Campos, quando em Jacareí existem duas.
A propósito de coletorias federais, não é demais lembrar que São José vem pleiteando a criação de uma delegacia seccional do imposto de Renda, pois há milhares de processos paralisados naquela repartição, por absoluta falta de meios de dar-lhes andamento. Quando redigimos estas notas, o sr. Lamartine, que responde pela coletoria de São José, nos comunica que mais de quinhentos processos de lançamentos ex-oficios lhe chegaram as mãos, nestes poucos dias, de uma só vez, processos que vão ficar aguardando melhor oportunidade…
Santana possuiu um posto policial. Hoje, por falta de acomodação, já não existe tal melhoramento.
O distrito encontra-se, não obstante, constantes reclamações na Câmara de São José, completamente despoliciada, há muitos meses. Disto resulta que a população vive em perene preocupação, devendo tomar, por seus próprios meios, a sua defesa, já que o único soldado que aparece em Santana é o que faz ponto à porta do cinema. Numerosos conflitos se deram no recente baile da Associação Atlética, para aquisição da televisão. Não havia um policial ali. E só não, houve ocorrências graves a lamentar, por uma questão de sorte.
Outros moradores acrescentam informações a essa. Cita-se o bárbaro atentado sofrido por um jovem estudante, na cabeceira da ponte do Paraíba, moço pertencente a tradicional família santanense, agredido a pontaços de canivete, na noite do Natal, quando tomava a defesa de uma doméstica que o acompanhava.
A esses casos, aduz-se o que vem acontecendo no prédio do Grupo Escolar do Alto da Ponte, recentemente inaugurado. O edifício acha-se praticamente abandonado, aguardando a sua diretora a ligação da eletricidade, para transferir sua residência para as dependências destinadas a tal fim, existentes naquele próprio estadual. Maltas de desordeiros se reúnem, de preferência a noite, no galpão do Grupo, cometendo tropelias e depredações, sem que providências sejam tomadas para impedir tal abuso.
“Olhe, seu moço, a turma só se lembra de Santana para arrecadar impostos e fazer algum melhoramento em véspera de eleição. O mais é este abandono que o senhor vê.“
Cidade a parte
Santana do Paraíba é uma cidade á parte, ligada a São José pelos ônibus circulares, de 15 em 15 minutos. Tem vida própria, sua sociedade, seus estabelecimentos. Ainda agora teve criado seu primeiro ginásio, que funcionará no prédio do Grupo Escolar.
Seus moradores, há muito radicados ali, amam enternecidamente aquele pedaço de chão. Famílias como os citados Prianti, Rennó, Guimarães Claro, Machado, Ramos Araújo, Freire, Vespasiano, Ferreira, Maia, Veneziani, Assis, Santana, Bertolini, ali fincaram raízes e trabalham pelo engrandecimento do lugar.
Santana tem suas festas próprias como a tradicional do Espirito Santo e da Padroeira, que atraem multidões. Recebe visitas episcopais, comemora seus fastos, e até na última guerra teve seus próprios expedicionários, que foram recebidos entre festejos memoráveis.
Justo é, pois, que para lá voltem as autoridades suas vistas, pensando que é tempo de olhar por aquele distrito que, centro de vasta zona rural, constitui um aglomerado humano que só não é município por um acaso geográfico e não recebe nem as atenções que geralmente se votam a bairros sem expressão econômica, ou de qualquer natureza.
O Estado de São Paulo, domingo, 9 de janeiro de 1955
Do processo de industrialização ao mito da mulher bonita: é Santana
Santana já fez movimento tentando tornar-se independente de São José dos Campos. Como é viver no bairro hoje?
Como é morar num bairro feito o Santana onde, há muito tempo existem, cemitérios, paróquias, Cartórios de Registro Civil, Tabelião de Notas, posto de puericultura, grupos escolares, ginásios estaduais, maternidade, ambulatórios, hospital, praças de esporte, supermercados, cinemas, bancos, ou seja, uma infraestrutura capaz de atender a todos? Segundo os moradores que foram entrevistados pela equipe de reportagem do Valeparaibano, o bairro, apesar de ser auto suficiente em comparação a outros, deixa muito a desejar com relação a segurança, sendo que, frequentemente durante a noite, os moradores são assaltados em suas próprias residências ou na rua. Mas, por outro lado, a maioria concorda que morar no Santana é “outra coisa” pois não é preciso sair do bairro para fazer compras ou serviços bancários, uma vez que existe um variado comércio com capacidade de atender a toda população.
Conversando com o advogado Altino Bondesan, há mais de 50 anos morando em São José dos Campos, ele quando veio morar em São afirmou que desde 1935, quando veio morar em São José, o atual bairro já era, de Paz, ou seja, existia no naquele tempo, um Distrito local um Cartório de Registro Civil que servia à população que morava “do lado de lá da linha central”, sendo considerado o 1o Sub-distrito do local e o 2o Sub-distrito em toda faixa central. Com o passar do tempo, o progresso aumentou e surgiram então as primeiras Vilas tais como, César, Rossi, Anchieta, etc…As outras, situadas além da ponte do Rio Paraíba, vieram logo após Sinhá, Telespark, Dirce, São Geraldo, Cândida, Paiva etc…” Antigamente a ponte que ligava a cidade com o outro lado do rio era muito estreita e por ela só passava um automóvel de cada vez e alguns pedestres“, diz Altino, “Santana era somente um conjunto de casas que iam desde a praça Santa Cruz á Igreja de Santana e daí até a Rua Paraíba que ligava a vila a cidade. Em 1923 a Rua Paraíba recebeu o nome de Rua Rui Barbosa, em homenagem a este grande brasileiro que morreu no mesmo ano“, ressalta o advogado.
Surto industrial começa a atingir todo o bairro
Em 1901 nasce o primeiro jornal dedicado ao bairro do Santana, o “Santanense”. E na década de 20, com a chegada da Tecelagem Parahyba o progresso foi acelerado e mesmo os problemas que a indústria sofreu por causa da pressão de alguns políticos que não acreditavam no desenvolvimento da mesma, alegando que haveria mais gastos do que lucros. A Tecelagem progrediu e entusiasmou aos demais industriais e anos após sua instalação, em 1935, uma cooperativa de leite instalou-se em Santana, seguida, então pela Rhodosá (hoje Rhodia), que se fixou no bairro dez anos depois. Com a coragem destes industriais em instalarem-se no Santana, iniciou-se todo o processo progressista, fazendo do bairro o Centro Industrial de São José. Após o sucesso das primeiras fábricas, vieram a Cerâmica Weiss, a indústria de louças Santo Eugenio (na verdade Conrado Bonadio, na Rui Barbosa 651) e algumas outras de pequeno porte, além de olarias e umas pouquíssimas fábricas de ensacar café e arroz. Devido a prosperidade do bairro foi criado em Santana, a primeira Associação de Operários, a qual foi denominada de “Fraternidade Operária”.
Fora as indústrias, Santana contava também com um grupo de teatro amador, que apresentava peças no bairro e na cidade, criaram-se bandas de músicas, e construiu-se um cinema. Cemitério e escola municipal “Olavo Bilac” vieram depois.
Passados alguns anos, a cidade de São José consegue ultrapassar Taubaté em arrecadação, principalmente federal. “Foi quando indiquei, em um artigo publicado no “Estado de São Paulo“, o nome à cidade de “Capital do Vale do Paraíba“, afirma Altino dizendo que só na Rhodosá o imposto de renda arrecadado ultrapassada as cifras de toda a cidade de Taubaté”.
Mineiros vinham ao matadouro, mas ficavam
Por estar situado no meio do caminho entre os Estados de São Paulo e Minas Gerais, os mineiros que optaram por São José acabaram se instalando no Santana. “Devagarinho e bem quietinhos” como diz Altino, trazendo consigo toda a família e a “garra” de vencer. As moças mineiras, famosas pela formosura e beleza, conquistavam os corações de todos os rapazes, tanto da cidade como do próprio bairro o que gerava uma eterna rixa. Era o bairrismo. Conta Bondesan que muitos garotos da cidade, de famílias tradicionais apanharam e bateram por causa das garotas mineiras e mesmo pelas moças que moravam no Santana e que também eram lindas. “As filha dos moradores do bairro vinham estudar na cidade e elas foram a causa de muitas brigas entre os rapazes. Criara-se o mito de que mulher bonita morava no Santana. Realmente as moças do Santana eram lindas” conta Bondesan. “Eu mesmo quase me casei com uma delas”. Eram tantos os mineiros no bairro que em ruas inteiras só se encontravam famílias deste estado, “o motivo de toda esta “mineirada” no Santana se devia ao fato de ser lá o local do matadouro da cidade e que por ficar na saída para Minas Gerais, os viajantes que entregavam seus animais ao matadouro resolviam ficar por ali mesmo”, conta Bondesan. Diz um farmacêutico deste bairro, Everaldo José Santana, que o lugar é uma filial do Estado de Minas Gerais.
Hoje só resta a saudade da”mineirinha”
Por volta da década de 40, surgiu na cidade um movimento para tornar o bairro de Santana independente.
Seria outro município, o que não foi adiante pelo fato do mesmo estar localizado muito próximo da cidade. “A ideia não encontrou amparo. Quase na mesma época Monteiro Lobato, depois de pertencer a Caçapava e São José, quando era conhecido como Boqueirão, tornou-se independente de São José dos Campos“.
O comércio local, no que afirma Altino, sempre foi próspero na boca da zona rural, destacando o desenvolvimento dos Irmãos Prianti, Cassiano, Raul Ramos de Araújo, José Cândido Ferreira, Ismael Santana.
“Já em matéria de “comestíveis”, houve o famoso Bar do Gessino, cozinheiro talentoso, onde todos os turistas que iam para Campos do Jordão paravam para comer alguma coisa”. Mas, não era só o comércio e as indústrias que os santanenses possuíam. Além disto tudo, que trouxe o progresso para o bairro e com o que eles convivem até hoje, o Santana tinha também uma vida social muito agitada, com corridas de cavalos e charretistas, shows que eram realizados na fazenda dos Veneziani Dias, família tradicional do Santana. Dessa família, Altino foi o primeiro motorista de táxi de São José dos Campos e a Nica, uma parteira que trouxe à vida muitos santanenses. “Por volta de 1935, veio para o bairro o Clube de Regatas do Parahyba trazendo boas opções de diversão. E em todos os 1o de maio, comemorando o dia do trabalhador, se reuniam operários vindos de Jacareí em barcos enfeitados pelo Rio Paraíba afora, a fim de fazer piquenique às margens do rio. Uma festa muito bonita“, afirma Altino Bondesan, acrescentando que o povo além de patriota, sendo que, muitos foram para a guerra, se também muito religiosos. “A Matriz do bairro foi reformada pelo então padre Luiz Cavalheiro, atualmente monsenhor de São José dos Campos“.
Um acontecimento muito interessante, o qual fez rir os moradores da época foi a inauguração do cemitério da Paz, em Santana. “Bueninho”, ou Bueno de Vasconcelos, comprou uma farmácia no bairro. Logo em seguida, inaugurou-se o cemitério da Paz e seu compadre, sr. Soares, começou a dizer que com a mudança do farmacêutico para o bairro, foi aumentando tanto os números de “defuntos” que o cemitério teve que ser transferido para lá”. Bueninho, um homem bem humorado e queridíssimo, como diz Altino, se fixou em Santana com a amabilidade de quem veio de Minas e, convertendo-se em paulista, lutou em 32, na revolução e “tomou São José a golpes de bondade“, afirma o advogado.
Valeparaibano, domingo, 24 de agosto de 1986
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