O Coronel Sérgio Sobral de Oliveira (tratado por Brigadeiro porque passou para a reserva com os proventos de Brigadeiro) assumiu por nomeação a Prefeitura de São José com a missão de aqui implantar o projeto previsto pela Doutrina de Segurança Nacional da Escola Superior de Guerra. A própria terminologia por ele adotada remetia a esta missão. Desativar; manobra diversionista; manda quem pode, obedece quem tem juízo; hierarquia; comando.
Começou por “desativar” o Conselho Municipal de Cultura e o Departamento Municipal de Educação Física e Esporte (DEMEFE) que construíam e aplicavam uma política pública específica para cada uma dessas áreas, mas articuladas como programa de governo. Entretanto, na falta de quadros formados para implantar o projeto desejado, teve de buscar pessoas que compunham os quadros da administração municipal, quer da Prefeitura como da Câmara.
Luiz Paulo Costa – Jornalista
Concessão do Serviço de Transporte Público
O prefeito Elmano Ferreira Veloso havia promovido concorrência pública para a operação do serviço municipal de transporte público. Venceu a licitação a Empresa de Ônibus São Bento, mas a concorrência não havia sido adjudicada, isto é, não havia ainda a possibilidade de ser firmado o contrato de concessão do serviço pelo prazo previsto de 10 anos.
O empresário de ônibus Ferdinando Salerno solicita e obtém audiência com o prefeito Sérgio Sobral. Comparece com um famoso advogado de São Paulo. No gabinete acompanha também a audiência o assessor jurídico José Rubens Barbosa (egresso da Câmara Municipal) e o diretor jurídico da Prefeitura, advogado Genaro Tavares Guerreiro.
“Pois não, nobre empresário“, abre a reunião o prefeito Sobral. “O que o senhor tem a dizer?” O empresário Ferdinando Salerno passa a palavra ao seu advogado de São Paulo. Ele faz o histórico do que aconteceu, de todas as fases da concorrência pública e finaliza dizendo que não resta outra coisa a ser feita senão a adjudicação da concessão do serviço à Empresa de Ônibus São Bento, a vencedora do certame.
Sobral ouvia tudo atentamente. Ao final perguntou: “E se eu não, como o senhor disse?” “Adjudicar!” “E se eu não adjudicar, o que acontece?” “Bem, bem, daí… não vejo outra saída, senhor prefeito!”, diz o advogado, enquanto o empresário Salerno tira do bolso mais uma vez o lenço para enxugar o suor que lhe escorre pelo rosto. “Pois bem, senhor empresário“, finaliza Sobral, “vou reunir minha assessoria jurídica e depois volto a conversar sobre a adjudicação!”
Na saída, percebe-se olhar fulminante do empresário Ferdinando Salerno para o seu advogado pela má conclusão da audiência. Os dias passaram e a adjudicação não acontecia. O empresário de ônibus ansiava por informações em consultas quase diárias. Até que surgiu uma luz no fim do túnel. Sobral decidiu adjudicar à Empresa de Ônibus São Bento a concessão da operação do transporte público, desde que houvesse efetiva melhoria de sua prestação do serviço aos usuários, principalmente com a aquisição de dez novos ônibus para aumentar a frota.
Luiz Paulo Costa – Jornalista
Manobra diversionista
Sobral achava que a bucólica São José era muito provinciana. “Onde já se viu fechar o trânsito para as pessoas passearem pela rua central da cidade?!” Criticava ele o “footing” pela rua 15 de novembro (chamada de rua Direita), ao som das músicas e reclames do serviço de alto falante PL-1. Os rapazes ficavam na calçada ou no Bar e Restaurante Santa Helena, Bar Paulistano, Bar 15, Lincoln Bar, paquerando as moças que passavam pela rua. Quando havia reciprocidade nos olhares, logo estavam caminhando juntos.
Resolveu então reformar mais uma vez a Praça Afonso Pena, desta feita construindo uma pista de dança. A inauguração aconteceu com grande alarde e nesta noite o trânsito não foi fechado na rua 15 de novembro, assim se sucedendo nos finais de semana subsequentes, desaparecendo a tradição do “footing” pela rua 15 de novembro. O fato foi comemorado por Sobral como a vitória de “uma manobra diversionista“: enquanto alguns se divertiam na pista de dança, outros não conseguiam passear entre os carros que transitavam livremente pela 15 de novembro.
A pista de dança que tempos depois acabou “desativada” por absoluta ausência de dançarinos interessados em trocar os salões de dança, antes disto acabou sendo registrada em histórica sentença do Juiz de Direito da 1a Vara da Comarca, Dr. Fernando Febeliano da Costa Neto, como “o sovaqueiro do Sobral”.
Luiz Paulo Costa – Jornalista
Governo Itinerante
Muito antes do governador Paulo Maluf, o prefeito Sérgio Sobral promoveu o “governo itinerante” em São José. Com o objetivo de popularizar um governo não investido pela soberania popular e sim pela vontade exclusiva dos detentores do poder autoritário, Sobral iniciou a promoção de audiências públicas nos bairros da cidade. Assim sendo, levou sua equipe de governo a visitar as regiões da cidade, atendendo os munícipes e encaminhando as reivindicações e pedidos.
No bairro Chácaras Reunidas, de população rarefeita por ser área de predominância industrial, numa destas audiências públicas, que estava sendo realizada numa escolinha de madeira (o bairro ainda não comportava a construção de uma escola em alvenaria), Sobral atendia os munícipes que tinham que subir por uma escada para serem atendidos no interior da escola. Uma senhora adentra o recinto, toda esbaforida, em seu vestido de chita amarrotado, manchado e meio molhado, de chinelo de dedo, perguntando: “Quem é o prefeito Sobral? Quem é o prefeito Sobral?”
A secretária Terezinha Kojio logo a conduziu à presença de Sobral, que todo solícito disse: “Sou eu minha senhora!” Ela então expôs o seu problema. Ela vivia de lavar e passar roupa para a vizinhança. Não aguentava mais o seu marido. Ele chegava todo dia bêbado em casa. Batia nela e nos filhos. E queria uma providência do prefeito! Sobral explicou que aquele não era um problema para ser resolvido pelo prefeito. Era um caso de polícia ou mesmo da Justiça. Chamou os advogados Annibal Augusto de Almeida e José Rubens Barbosa, que ele trouxera da Câmara para a Prefeitura, para explicarem a questão para a senhora.
Ela deixou a audiência demonstrando não estar convencida de que o prefeito não pudesse resolver o seu problema, mas sem ouvir o comentário que Sobral fez depois para os seus assessores: “Como eu posso condenar o marido desta senhora?! Se eu fosse casado com ela, mulambenta como está, eu também chegaria em casa bêbado todos os dias!”
Luiz Paulo Costa – Jornalista
Plano Diretor
No final de 1969, a Serete, uma empresa de planejamento constituída pelo urbanista Jorge Wilheim, economista Chico de Oliveira e outros renomados profissionais, associada à paisagista Rosa Kliass e a outros especialistas, concluiu o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado de São José dos Campos. O prefeito Sobral, nomeado em fevereiro de 1970, foi contatado para recebê-lo. De início relutou. Era coisa feita por comunistas. Jorge Wilheim, Chico de Oliveira e outros profissionais envolvidos, de fato, eram homens e mulheres de esquerda, alguns socialistas ou mesmo comunistas, mas o Plano Diretor realizado era um avanço em termos de planejamento urbano.
O arquiteto Willy Pecher e outros profissionais da Prefeitura participaram de sua elaboração, garantindo-se assim que a sua implantação poderia observar as suas diretrizes independentemente dos profissionais de fora. Sobral acabou se convencendo de que poderia ter em mãos um instrumento de planejamento urbano valioso. Recebeu o trabalho e tratou de encaminhar à Câmara de Vereadores os seus anexos, nada mais nada menos do que os projetos de lei de uma Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano (Zoneamento Urbano), dos Códigos Administrativo e Tributário, com o que a cidade pode se modernizar sem perder a sua qualidade de vida.
Certamente o êxito ou não das ações empreendidas pela administração municipal nesta época (1970-1974) possuem a marca do prefeito Sérgio Sobral e do período autoritário em que se vivia, mas o que ficou para o bem da cidade foi o que decorreu do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado e da vontade política que existiu para que as leis dele originadas fossem verdadeiramente cumpridas. Perguntado sobre o que realizou Sobral, o ex-prefeito José Marcondes Pereira afirma: “Os sacos de lixo!”. Mesmo que com ironia, a menção diz bem de um momento em que a cidade continuou a avançar em organização da máquina pública e de sua população, inclusive para derrotar Sobral nas eleições de 1972 e 1974.
Luiz Paulo Costa – Jornalista
“O senhor estava do outro lado!”
Conversei mais longamente com o ex-prefeito Sérgio Sobral de Oliveira, em 1997, quando iniciava a trabalhar como Auditor Geral na administração do prefeito Emanuel Fernandes. Acredito que ele seria o Secretário de Desenvolvimento Econômico da Prefeitura. Pouco antes de seu falecimento, conversando no Salão Nobre da Prefeitura, reconheci, apesar de nossas divergências, a importância de sua administração para a cidade, em especial a implantação da rede de ensino fundamental. E ele me cutucou: “É, mas o senhor estava do outro lado naquela época!” Depois falou que se pudesse voltar no tempo não teria permitido a verticalização da cidade, reconhecendo aí uma das lutas travadas pelo MDB na época. Sobral certamente poderia ainda ter sido muito útil para a cidade.
Luiz Paulo Costa – Jornalista
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