Chamou minha atenção a notícia do ValeParaibano, edição desta última terça-feira (10/08./1999), de que a maioria dos entrevistados pelo jornal preferia a preservação do “penicão” da Praça Afonso Pena à sua demolição. “Esse é um monumento quase histórico, que todo mundo conhece. A Prefeitura deveria cuidar, colocando um guarda municipal para vigiar.”, disse o funcionário público Fábio Pinheiro, 23 anos. Já o comerciante Walter Augusto Fernandes, 45 anos, afirmou: “O certo seria preservar porque eles estão destruindo algo que foi construído com o dinheiro público.”
Mesmo sem uma pesquisa de opinião pública, baseada em amostragem cientificamente aceita, o noticiário, acredito, reflete o sentimento da população. Em primeiro lugar porque São José é uma cidade de crescimento tão rápido que o acontecido há dez, vinte anos atrás, já virou história e a história deve ser preservada. Por outro lado porque não será com a simples demolição do anfiteatro da praça que se acabará com a prostituição infantil. Ele pode até representar, no momento, um símbolo emblemático para a cidade no combate à prostituição infantil. E tal qual um “muro da vergonha” sua destruição pode abrir caminho para novos tempos!
Porém, se os atores sociais principalmente nossas autoridades constituídas e instituídas não fizerem a sua parte (eu diria até um pouco mais do que a sua parte), amanhã poderemos estar demolindo a tribuna livre da Praça Cândido Dias Castejón, o antigo caramanchão do Jardim do Sapo ou o coreto da Praça Maurício Cury, e a prostituição infantil continuará a nos envergonhar, a ser explorada pelos “Ratinhos da vida” e a ser tema de inflamados discursos eleiçoeiros.
O Estatuto da Criança e do Adolescente nasceu em São José. Por idealização e mobilização do saudoso prefeito Hélio Augusto de Souza, foram apresentadas pelo deputado Robson Marinho, na Assembleia Nacional Constituinte, as diretrizes básicas que passaram a fazer parte da Constituição Federal e hoje norteiam esse diploma legal. São José tornou-se também a cidade mais avançada na implementação de seus dispositivos, criando o Conselho de Defesa da Criança e do Adolescente, inserindo seus princípios na Lei Orgânica do Município, instalando o Conselho Tutelar, abrigando a Vara da Criança e do Adolescente com Juiz, Promotor, Corpo Técnico e Funcional, etc., etc., etc..
A Cidade de São José até recebeu prêmios internacionais, por seus programas pioneiros em defesa da criança e do adolescente. O cidadão contribuinte investe crescentemente milhões e milhões de reais em programas sociais. A FUNDHAS consome dez milhões de reais em seus programas de atendimento às crianças e aos adolescentes. A Secretaria de Desenvolvimento Social, mais dez milhões de reais em suas atividades. E, de repente, constata-se que os investimentos sociais de tantos anos acumulados e aumentados não foram suficientes para impedir que dez ou vinte crianças se prostituam em pleno centro da cidade!
Será que desses milhões e milhões de reais não sobraram alguns poucos milhares de reais para amparar essas poucas crianças e suas famílias, evitando a vergonha de toda uma cidade em ver as suas crianças se prostituindo e sendo mostradas para todo o Brasil? Será que toda essa milionária estrutura de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes não foi e é capaz de impedir a prostituição de uma ou duas dezenas de crianças no município pioneiro dos direitos constitucionais das crianças e dos adolescentes? Se fossem bovinos, ovinos ou caprinos estariam sendo assistidos pelo Ministério ou Secretaria da Agricultura ou recolhidos por uma associação de defesa dos animais. Infelizmente, no entanto, são apenas crianças! Crianças pobres de um pobre País!
A Praça Afonso Pena não é a mesma de minha infância. Ali brinquei entre plantas, flores e árvores originárias da Mata Atlântica, trazidas e plantadas pelas mãos generosas do saudoso paisagista Gregório Gurevich. A praça mudou tanto que até já não é mais conhecida como “Jardim do Gregório”, uma homenagem popular ao seu criador. Mas, como eu gostaria hoje que a praça não tivesse mudado!!! Que fosse a mesma praça de minha infância. Onde as crianças, inocentes e alegremente, apenas brincavam. Sem a maldade que hoje povoa a praça. Onde nem as crianças estão livres de se prostituírem sob olhares complacentes, coniventes ou maliciosos de uma cidade que com isso vai perdendo a dimensão do ser humano. (1999).
Luiz Paulo Costa – Jornalista
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