A sua bênção, Chico Triste

“Toda pessoa sempre é as marcas das lições diárias de outras tantas pessoas.” (Caminhos do Coração, Luiz Gonzaga Júnior, Gonzaguinha)

Durante agosto de 2015, mês do folclore, lancei o meu livro “A sua bênção, Chico Triste” sobre a vida e a obra do professor Francisco Pereira da Silva (1918-1981), o folclorista Chico Triste.

Quando me escolheram para ser membro da Academia Joseense de Letras (AJL), retomada depois de muitos anos a partir do Clube de Joseenses e Amigos, escolhi o jornalista, professor e folclorista Francisco Pereira da Silva (1918-1981), o Chico Triste, um dos fundadores da própria Academia Joseense de Letras, para ser o Patrono da Cadeira nº 4 que ocupo, por ser uma das pessoas que me ensinaram muito do que sei e sou hoje. Com ele aprendi a caminhar com o povo em suas andanças pelo mundo do folclore em nossa região do Vale do Paraíba. Conheci o professor Francisco Pereira da Silva no quarto de outro de meus mestres, que ficou paraplégico em acidente automobilístico, o jornalista Edward Simões. Chico Triste fundou o jornal “O Valeparaibano” em Caçapava e com Edward Simões trouxe-o para ser diário em São José dos Campos.

‘ Ambos estavam trabalhando na edição do segundo Álbum de São José dos Campos. O primeiro, Edward Simões havia editado com José Marcondes Pereira, Jamil e Neif Mattar de Oliveira, em 1951. E daí em diante era raro a noite em que não me encontrava com eles para um bate-papo naquele quarto pelo qual passava a vida da estância climática de São José dos Campos. Logo após a morte do jornalista Edward Simões (1928-1963), participei com o professor Francisco Pereira da Silva da fundação da Associação Cultural “Edward Simões”. Em agosto de 1963, sob a inspiração do folclorista Chico Triste, esta entidade promoveu o Mês do Folclore, composto de um seminário na Escola Normal do Colégio “Cel. João Cursino” e de uma exposição de arte popular na rua 15 de Novembro. Aqui estiveram os grandes nomes do folclore nacional como Renato de Almeida, Alfredo João Rabaçal, Maria de Lourdes Borges Ribeiro e Rossini Tavares de Lima, com demonstrações práticas de fatos folclóricos do município. .

Ajudei-o na exposição da obra de um artesão de Mogi das Cruzes. Lembro bem da viagem que fizemos pela estrada Velha Rio-S. Paulo em seu fusquinha (mas sem a sua cadela Chiba, que era muito brava). Para molhar a goela paramos numa vendinha à beira da estrada de terra. Pedi uma cerveja que o dono foi logo tirando de uma pequena geladeira. O sergipano crispado pelo sol do sertão foi logo atalhando: “A minha pode trazer sem gelo!”. Ele era assim, ao natural, embora sempre vestido de terno escuro ou cinza e com gravata, preferia andar na calçada pelo lado em que o sol batia.

Major reformado da Polícia Militar do Estado de São Paulo, optou pelo ensino das letras, cursando licenciatura e lecionando em Caçapava, São José ou quer onde necessitassem de seus ensinamentos. Jornalista fundou várias publicações e colaborou com tantas outras. Participou de inúmeras atividades, mas foi no campo da cultura popular que o seu temperamento aparentemente iracundo tornou o professor Francisco Pereira da Silva mais conhecido por Chico Triste. Integrou a Comissão Paulista de Folclore, do Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura da UNESCO, departamento das Nações Unidas (ONU). Concluiu curso de folclore no Instituto de Extensão Cultural da Escola de Sociologia e Política de São Paulo, em 1961, foi membro efetivo da Associação Brasileira de Folclore e um dos seus palestrantes sempre convidado para seminários e encontros sobre folclore.

Interessado em fazer uma matéria jornalística como correspondente do jornal O Estado de S. Paulo, acompanhei-o até o distrito de São Francisco Xavier onde ocorria a Dança de São Gonçalo. Na oportunidade, ele concluía uma monografia sobre o Desafio Calangueado e um dos maiores calanguistas de nossa região, Ernesto Vilela, lá estaria. Fiz a reportagem para o jornal e pude acompanhá-lo também no recolhimento de material para a sua monografia. O gravador que levou enguiçou e ele usou o meu para concluir o seu trabalho, assim como para recolher várias modas de viola que os violeiros das redondezas cantavam, no entremeio das “voltas” da Dança de São Gonçalo, para outra monografia dele sobre a “Moda de Viola”.

Chico Triste nos deixou vários livros sobre a cultura popular: Miçangas Folclóricas, O Desafio Calangueado, Apontamentos de Folclore (didático), Itinerários da Capoeira (folclore histórico), Moda de viola (literatura oral no Vale do Paraíba), Dança do Povo Piraquara (inédita pesquisa de campo) e Tesouros Encantados (em preparo).

Em janeiro de 1967, numa reunião da Comissão Organizadora das Comemorações do Bicentenário de São José dos Campos, elevada à categoria de vila em 27 de junho de 1767, soube por ele que o diretor do Colégio “João Cursino”, professor José Madureira Lebrão, pedira a ele que elaborasse algumas páginas sobre as sobrevivências folclóricas no município, o que integraria a participação multidisciplinar do Instituto de Educação nos festejos comemorativos. Pedi-lhe autorização para publicá-las em série no jornal “O Valeparaibano” do qual era redator, complementado, inclusive, com os fatos folclóricos que ele informou que não teria condições no prazo determinado pelo diretor da escola. E assim foi publicado o “Roteiro Folclórico de São José dos Campos”, para conhecimento de todos e, especialmente, daqueles que, vaticinava Chico Triste, folcloristas credenciados que viriam depois.

Em 28 de Agosto de 1983, por Decreto Estadual, o professor Francisco Pereira da Silva passou a denominar a Escola Estadual da Vila Tatetuba, em São José dos Campos. Localizada na Vila do Tesouro, também na região leste joseense, encontra-se a Casa de Cultura Chico Triste, fundada pela Fundação Cultural Cassiano Ricardo, em 1998. A Semana Chico Triste, criada em 2005 e realizada sempre em junho, promove oficinas, apresentações, exibição de vídeos, exposições, debates e palestras. O Museu do Folclore, inaugurado em 1997 no Parque da Cidade Roberto Burle Marx, mantém em seu acervo pertences e livros do Chico Triste e publicou em seu Caderno de Folclore números 9 e 10, as crônicas do Professor Francisco Pereira da Silva do jornal “Agora” entre 1974 e 1975.

Espero ter contribuído, humildemente, como ele gostava de se afirmar, para eternizar a obra sobre cultura popular do Patrono da Cadeira nº 4, que tenho a honra de ocupar na Academia Joseense de Letras. E ao professor, folclorista e jornalista Francisco Pereira da Silva a minha eterna gratidão: A sua bênção, Chico Triste!

Luiz Paulo Costa – Jornalista

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