Hélio Walter Bevilacqua (1917-2005)

Um privilégio de quem mora nessa terra é encontrar pelas ruas o professor Hélio Walter Bevilacqua, bisneto do maestro Francisco Santini que regeu O Guarani, em Salvador, BA, na presença de seu criador, Carlos Gomes, em 1868. E ai professor Hélio tudo bem? – Tudo bem fazendo o possível para resistir às intempéries, responde ele. De origem italiana pelo lado paterno, nasceu em 24 de maio de 1917, em Cachoeira Paulista, SP, criou-se na vizinha Lorena com a gente do velho Vale do Paraíba. O pai Vicente Antônio Bevilacqua paulista de Descalvado e a mãe Arminda Bastos Bevilacqua era paranaense, curitibana, filha de Manoel Pinheiro Bastos e Marieta Guimarães Bastos, família circense de origem portuguesa que se dedicava ao Teatro Mambembe e Saltimbancos.

Hélio Bevilacqua chegou à São José em 1942, tornou-se um professor estimado e famoso na cidade. A Câmara Municipal, através de projeto do então vereador Luiz Paulo Costa, lhe outorgou o título de Cidadão Joseense, em 1995.

Em 16 de novembro de 2001, tivemos o prazer em falar com o professor Hélio Bevilacqua, sentados num banco, em frente à Padaria Vulcão, ao lado do Mercado Municipal. A vida do professor dá um livro.

O professor Hélio nos conta: “Papai chegou ao Vale do Paraíba nos idos de 1912 e ingressou no Exército. Com minha mãe D. Arminda teve seis filhos: Elza a mais velha é falecida, foi casada com Walter Gonçalves um locutor e cantor que havia trabalhado na PRD-3, Petrópolis Rádio Difusora.

Em seguida venho eu e a Henny que é solteira e mora na casa dos nossos pais, em Lorena. Depois, Ernani Roberto Bevilacqua, casado com Yvone Januzzelli Bevilacqua que estão em Taubaté, ele foi professor de desenho do Ginásio Estadual Monteiro Lobato. Edla Vicentina Bevilacqua Marcondes está em Piquete, SP, viúva do José Cursino Marcondes. A Ethel Mary Bevilacqua reside em Ribeirão Preto.”

Os avós Vicente Antônio Bevilacqua e Amanda com os netos Carlos 9no colo), Elza Regina e Joaquim, em 10 de julho de 1948.

O pai: Papai foi praça no 53° Batalhão de Caçadores de Lorena, mais tarde II Batalhão do 5° RI e se reformou como primeiro tenente músico. Um autodidata versátil que tocava de tudo, profundo conhecedor de harmonia e contraponto. Em seu relacionamento estiveram grandes maestros como Braga, Vila Lobos, Guarniére, Souza Lima.

O curso primário: Estudei o primário no Grupo Escolar Conde de Moreira Lima, em Lorena, me lembro de alguns professores: D. Genésia Domênico, D. Bartira, D. Otília, D. Mariquinha Braga, Francisco Prudente de Aquino que era brabo, rígido. O professor Ferreira, D.Sinhá…
Um tempo de educação com disciplina, não tinha conversa mole, papo furado como se diz hoje. Se o aluno ia mal, castigo em cima, repreensão e expulsão.

O curso secundário: Fiz no Ginásio Municipal São Joaquim, hoje Colégio São Joaquim, salesiano dos antigos nos padrões do Colégio Pedro II, do Rio de Janeiro. Até 1934, foram 5 anos de estudo, dos melhores, incluindo português, aritmética, desenho, geografia, filosofia, química, física, história natural (biologia), como um curso universitá-rio de hoje.

Recebendo o Título de Cidadão Joseense, com dna. Leny, em 1985.

Em 1930, vieram os gaúchos: As forças comandadas por Getúlio Vargas depuseram o presidente Washington Luiz que foi exilado em Portugal e não pisou o solo pátrio enquanto Vargas permaneceu no poder.
Getúlio havia prometido eleições, não cumpriu. No dia 9 de julho o estopim do levante foi aceso na praça da República quando faleceram os quatro estudantes paulistas Mauro, Miragaia (de São José), Dráusio e Camargo. Nascia o MMDC e a Revolução de 1932.
Lorena virou praça de guerra, o ex-governador paulista Adhemar de Barros, à época capitão comissionado, ocupou o quartel local aprisionando dois tenentes, um era meu pai.
Com 15 anos, observava os movimentos das forças na serra, os combates, os tanques, os trens blindados.
Em Cruzeiro o negócio ficou feio, tumultuou a vida das pessoas. A cidade ainda preserva um túnel de acesso à Passa Quatro, em Minas.

Professor de Inglês: Conhecendo o meu preparo intelectual, algumas escolas de Lorena me ofereceram aulas. Um belo dia, meu cunhado Walter Gonçalves, professor de história no Ginásio Municipal de Cruzeiro me indicou para lecionar matemática ou inglês. Optei pela língua bretã e tomei gosto.

Em casa de dna. Tita: Quem não a conheceu! Que saudades! Uma senhora ilustre da tradicional família cruzeirense. De quando em vez, me hospedava em seu casarão assobradado onde membros da família real brasileira pernoitaram várias vezes.

Hélio Bevilacqua e o bisneto Lucas.

Funcionário público: Na época, imaginei um emprego estatal, algo seguro naquele tempo. Não existia o INSS e sim vários institutos por categoria, entre eles o IAPI, dos industriários. Em 1942, fui à São Paulo onde me inscrevi para um cargo, passei, e escolhi São José para trabalhar. Cheguei em 20 de julho, assumi como secretário e tesoureiro da primeira agência do IAPI, à rua 7 de Setembro antiga Rua do Fogo. O chefe era o Bandeira, um sujeito delicado, o Adelmo Liberato era contínuo. No início, pretendia morar no hotel San Remo mas o Fortunato, chofer de praça que me trouxe da estação férrea, me convenceu a ficar na Pensão Castilho, à rua Paraibuna, 83. Depois mudei para a Pensão Rocha, no centro, que existe até hoje. Morei também na pensão da D. Dina mulher do Nenê Cursino, perto do cemitério.

Eu era feliz e sabia bem disso, tinha um chapéu de caçador africano e um guarda-chuva fininho, me chamavam de mister Spring (Sr. Primavera). Havia pouca condução e todos caminhavam muito, inclusive eu que atravessava diariamente a João Guilhermino.

São José dos Campos: Tinha um centrinho bacana, com um serviço de auto falante chamado PL1, o Banco do Brasil na esquina da rua Quinze, o hotel San Remo, do Remo Cesaroni, um homem de cultura muito interessante, foi o idealizador do primeiro observatório astronômico da cidade. Várias vezes fui com ele e o professor Custódio apreciar as estrelas…
Havia a Casa Rachid, a Casa Confiança, a do Said Calil, do Fuad, o Suleima e a famosa farmácia da D. Genésia B. Tarantino, ao lado do prédio da Light. Na rua Quinze, o bar Paulistano do Santos Pinto, bar XV, hotel Santa Helena, o chalé do Pilé com o jogo do bicho, auto falante em cima e um clube onde o pessoal dançava.

Ensinando Inglês: Através do Adelmo Liberato, me convidaram para lecionar inglês a noite, na Escola de Comércio Olavo Bilac onde era diretor o professor Everardo Passos. A Escola Normal Municipal precisava de professores e fui aceito. Mais tarde, com a escola encampada pelo Estado optei pelo magistério. Houve um concurso de títulos e provas para efetivação, passei, lecionei até 1964 quando me aposentei.

Colegas de Magistério:Aqui alguns: Domingos Custódio, Joaquim Moura Candelária, Simão Shulster, Vera Maria Coutinho, Oswaldo Nascimento, Flávio Berlings de Macedo, Maria Nazaré Vieira, Maria Luiza Medeiros, Cleide Bonetti Calazans, Zélia Ortiz, Ramiro Pinto Faria, a Arshaluz que ensinava espanhol, Pe. Stefano Bohemisch, Luiz Gonzaga Guimarães Pinheiro, Rotschild, Anita que dava geografia, o Alan Darc Ferreira e o Domingos Barreira, juntos, fizemos um trenzinho de madeira pensando numa futura fábrica de brinquedos. Sempre me dei bem com os colegas, os milhares de alunos e os diretores como: Edésio Del Santoro, Xenofonte Strabão de Castro e José Lebrão.

Muitos alunos: Passaram por mim Pedro Ives Simão, o meu filho Joaquim Vicente, a Helena Calil muito linda que gostava de bagunçar na sala, a Cida Azevedo, a Lurdes Pinotti, o advogado Ulisses Bueno de Miranda escrevia um jornalzinho O Morcego, o Sérgio e o Leopoldo Weiss, o Carlos Tadeu Bento, Nasir Assad, os Bonadio, Becker, Bráulio de Melo, Veneziani. O Guilherme Preto que tornou-se excelente pianista, a Eládia Neme, o Zé de Melo…

O casamento: Conheci minha esposa a Leny Euzébia Ferreira, filha de Joaquim Ferreira Carpinteiro e Ismênia de Almeida Ferreira no curso noturno de contabilidade do Olavo Bilac. Olhares de cá, de lá, novamente… Até que o Moacir Benedito de Souza e o Joaquim Candelária me convenceram a falar com ela. De outubro a novembro, namoramos no portão todas as noites, até a D. Ismênia alertar: “Leny são 10 horas.”

Dna. Leny e os filho Joaquim Vicente, Elza Regina, Carlos Egberto e Rosãngela Ismênia no berço, em 1955.

Quando janeiro chegou: Ficamos noivos, e no mesmo dia do casamento do meu colega Joaquim Candelária pedi a mão da Leny. Marcamos a data para o dia 24 de junho, nos casamos na Igreja Matriz pelas mãos do padre Álvaro Biolchini meu professor no Colégio São Joaquim, de Lorena. Viemos então morar na rua Dolzani Ricardo, 192. Minha sogra morou conosco e muito concorreu para a educação de meus filhos.

Os filhos: O Joaquim Vicente Ferreira Bevilacqua foi o nosso primeiro filho, nasceu em 27 de março de 1944, um menino sempre brilhante e destacado. É advogado, foi vereador, prefeito da cidade por duas vezes e deputado federal também por duas vezes. Casou-se com Marialva e tiveram Luiz Vicente, Paulo Vitor e Vera. Em segundas núpcias com Celisa Anderaus Medeiros tem a Izabela.

A Elza Regina, nossa segunda filha, era um doce. Veio ao mundo em 21 de abril de 1946, infelizmente faleceu em 20 de fevereiro de 1983. Uma menina sempre tranquila e muito carinhosa. Foi casada e teve a Valéria e o Carlos Eduardo. Em 7 de julho de 1948 nasceu Carlos Egberto Ferreira Bevilacqua um menino bacana, comunicativo, louco por automóveis. Sua primeira mulher foi a Léa, filha do Romildo, gente de Jacareí. A segunda é a Ana, filha do Pontes, o popular Peninha, tiveram duas filhas, a Elza Regina (homenagem a falecida tia) e a Ana Júlia.

A minha caçula é a Rosângela Ismênia Ferreira Bevilacqua nascida em 17 de abril de 1954. Desde pequena era uma belezinha, é linda até hoje, trabalha em São Paulo, na Assembléia Legislativa de São Paulo.”

Rosa A. Medeiros sogra de Joaquim, Hélio Bevilacqua, Carlos Egberto, Rosãngela Ismênia, Joaquim Bevilacqua e dna. Leny.

Texto e fotos por Ricardo Faria, jornal Vale a Pena, março de 2004 (fariaricardo493@gmail.com)

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