Patrimônio Perdido – O Passado em Ruínas
O presente trabalho foi realizado pela Fundação Cultural Cassiano Ricardo em 2004, e entrega um estudo sobre nosso patrimônio perdido, aquele que foi referência no passado e hoje já não existe.
“A cidade se embebe como uma esponja dessa onda que reflui das recordações e se dilata. Uma descrição de Zaíra como é atualmente deveria conter todo o passado de Zaíra. Mas a cidade não conta o seu passado, ela o contém como as linhas da mão, escrito nos ângulos das ruas, nas grades das janelas, nos corrimãos das escadas, nas antenas dos pára-raios, nos mastros das bandeiras, cada segmento riscado por arranhões, serradelas, entalhes, esfoladuras.”
(Italo Calvino – As Cidades Invisíveis, 1993, pág. 14-15)
Cada um de nós, pelo menos uma vez na vida, esteve em contato direto com a História – tal como concebemos tradicionalmente. Ter feito parte de uma primeira turma de uma escola, freqüentado um espaço público que não existe mais, ir a um local de devoção com milênios de idade. Todos, sejam mais jovens ou mais velhos estão em sintonia com a história, pois ela se dá a partir de homens, dos membros da comunidade global. Esta influência como somos, como são as nossas reflexões diante da vida e em nossas ações. Desta forma, definem também como será a configuração de nossa região. É um círculo que se auto-alimenta: somos influenciados por ela e consequentemente geramos novos caminhos a partir desta influência.
São José dos Campos, uma cidade inicialmente de cunho agrícola, teve duas fases marcantes: como “Cidade Estância de Cura” da Tuberculose e uma outra fase, Cidade Industrial. Estas fases marcaram o crescimento populacional do nosso município, estreitamente ligado ao movimento migratório. Esta grande massa de imigrantes e migrantes definiram as feições da cidade. Entre as características principais deste fenômeno, a que nos interessa especificamente, trata-se da memória. Os moradores de nossa cidade, em sua maioria, vem de outras regiões trazendo suas histórias de vida, que tem como “pano de fundo” espacial as suas cidades de origem. Portanto, não sentem esta como sua cidade, pois seus locais de devoção, de divertimento, de relação familiar, enfim, sua memória emocional encontra-se na região natal. Assim, a cidade sofre muito mais com a falta de referências do que com um apego a tradições. Seus membros não conhecem sua história e, consequentemente, têm pouca relação afetiva com esta. Não se sentem membros dela.
Num caminho inverso, nascem os filhos dos imigrantes e migrantes (agora moradores de São José) tornando-se joseenses. Muitos deles viverão aqui, tendo suas referências históricas e emocionais ligadas a esta região. No entanto, o elo da cadeia da memória que os liga com o passado longínquo foi quebrado, pois a tradição oral, transmitida de pai para filho se referencializa na região natal dos pais. Possibilitar alternativas para a reabilitação deste elo é o objetivo principal das exposições patrimoniais. Ser uma ponte de ligação entre o passado longínquo conhecido dos poucos antigos nativos ou antigos moradores desta localidade e os novos, que necessitam desta ligação (história pessoal/história da cidade). As primeiras exposições tiveram como mote a memória/história de fases que deixaram rastros no corpo de nossa cidade: Sanatórios, antigas fábricas, nomes de ruas. Esta exposição tem como foco um caminho contrário a este: o que foi perdido. São José dos Campos, como grande parte das cidades que tiveram um crescimento vertiginoso, construir-se sob si mesma. Grande parte das edificações que aqui existiram foram destruídas, em nome do Progresso, da Civilização, do Crescimento da Salubridade Pública, ou mesmo, da ganância imobiliária. Esta exposição-denúncia possui dois objetivos: estimular o Reencontro entre os elos moradores/história da cidade – conhecer para agir; O outro é a reação diante dos escombros – conhecer para defender: ou seja, impedir que o que ainda temos seja destruído, seja definitivamente perdido. Desejamos assim, uma excelente visita e que as novas gerações não necessitem fazer exposições destas para relembrar seus patrimônios perdidos.
“Evitem dizer que algumas vezes cidades diferentes sucedem se no mesmo solo e com o mesmo nome, nascem e morrem sem se conhecer, incomunicáveis entre si. Às vezes, os nomes dos habitantes permanecem iguais, e o sotaque das vozes, e até mesmo os traços dos rostos; mas os deuses que vivem com os nomes e nos solos foram embora sem avisar e em seus lugares acomodaram-se deuses estranhos. É inútil querer saber se estes são melhores do que os antigos, dado que não existe nenhuma relação entre eles, da mesma forma que os velhos cartões-postais não representam a Maurília do passado mas uma outra cidade que por acaso também se chamava Maurília.” (Italo Calvino – As Cidades Invisíveis, 1993, pág. 30-31)
Mansão dos Baracho
Pedro de Paiva Baracho foi um abastado fazendeiro em São José dos Campos. Juiz de Direito, foi em 1870 nomeado para a Comarca de São Simão. Em 1884, a Câmara Municipal de São José oficiou ao Imperador D. Pedro II, pedindo sua transferência para cá. Esta foi negada, permanecendo na região oeste do Estado por muitos anos.
Em outubro de 1884, entusiasmado com a campanha abolicionista, iniciada na Capital da Província por Antônio Bento, Dr. Pedro concedia alforria a 12 de seus escravos, sendo considerado o precursor da libertação de escravos na cidade. Construiu uma mansão no centro do município, em terreno próximo ao prédio da Câmara e Cadeia (atual Praça Afonso Pena). Passou por uma crise financeira, saindo da cidade na primeira década do século XX. Em 1909, esta casa foi adquirida pelo Governo Estadual e restaurada (sendo gasto 107 mil réis) onde se instalou o Grupo Escolar Olímpio Catão, inaugurado em 14 de Setembro de 1910. Este, o primeiro grupo escolar da cidade, foi fundado em 1896, inicialmente instalado no prédio de propriedade da Família Mascarenhas, localizado ao lado da Igreja Matriz (atualmente existe no local o Hotel San Remo). A partir de negociações entre a Câmara Municipal e o Governo do Estado, escolheu-se “a Mansão dos Baracho”.
A Festa de inauguração foi um grande evento social, realizado na própria escola, recebendo as autoridades locais e algumas estaduais, além dos representantes da “elite” joseense. Durante os quarenta e sete anos em que foi sede da escola, formou centenas de pessoas da cidade, inclusive vários políticos e artistas locais, como por exemplo, Cassiano Ricardo.
A Demolição do Grupo
A antiga Mansão dos Baracho, que durante anos foi o local onde se instalou o Grupo Escolar ” Olímpio Catão”, estava em 1954, em estado precário. Duas salas no pavimento superior estavam ameaçando ruínas, cedendo duas paredes, levando a direção a interditar as aulas nestas salas.
No mesmo ano, foi requerido na Câmara que tomasse providências sobre as condições do prédio. Em abril de 1954, o Secretário da Educação interditou o prédio, transferindo os alunos para outras escolas. Em maio vieram à cidade funcionários da Secretaria da Viação e da Secretaria da Educação para estudarem o local onde seria construído o novo prédio do Grupo “Olímpio Catão”. Ao mesmo tempo, visitaram um prédio localizado na Praça A. Pena, de propriedade de Pedro Rachid, para reunir as classes do antigo Grupo. Com a proposta da construção de novo prédio, mesmo em área próxima do antigo Grupo, propugnou-se ser revertido a mansão à municipalidade, propondo-se vários usos, até mesmo, museu municipal.
No entanto, para surpresa da cidade, em 1956, foi decidida a demolição do prédio pelo Governo do Estado e a construção do novo prédio do Grupo Escolar. Isto gerou protestos nos jornais da cidade e pela população. O prédio foi demolido em 1957, e o material de demolição aproveitado para ser construído o Grupo Escolar no Loteamento ” Monte Castelo”, realizado pela Firma ” Mascarenhas, Ferri & Cia LTDA”. Este Grupo foi denominado de Grupo Escolar ” Marechal Rondon”. Nesta mesma década, o “Marechal Rondon” foi transferido para a Avenida Brasil, passando a ser instalado neste prédio a Escola “Felício Savastano”.
Antiga Mansão dos Baracho posteriormente Grupo Escolar “Olympio Catão”.
Arquivo Público do Município
Grupo Escolar “Olympio Catão” década de 1920.
Memória Fotográfica – São José dos Campos 1916-1952
Grupo Escolar “Olympio Catão” em 1938.
Folha Esportiva Especial (Nenê Cursino)
Arquivo Público do Município
Escola “Marechak Rondon”
Acervo Particular Donato Ribeiro
Grupo Escolar “Olympio Catão” na década de 1930/40.
Arquivo Público do Município
Fundação Cultural Cassiano Ricardo
Eng°. Edmundo Carlos de Andrade Carvalho
Diretor Presidente
Diretoria de Patrimônio
Engº. Vitor Chuster
Diretor
Departamento de Patrimônio Histórico
Antônio Carlos Oliveira da Silva
Pesquisador – historiador
Donato Donizete dos Santos Ribeiro
Historiador
Lucas Brito de Siqueira
Estagiário de História
Kátia Araújo Branco
Estagiária de Direito
Fonte: Departamento de Patrimônio Histórico (DPH), Fundação Cultural Cassiano Ricardo (FCCR).
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Wagner Ribeiro – São José dos Campos Antigamente