O Exorcista Brasileiro é de São José (1976)

Uma mistura de ritual católico, Assembleia de Deus, sessão espírita e seita pentecostal, a Igreja do Evangelho Quadrangular-introduzida no Brasil há 28 anos tem produzido alguns profetas e líderes religiosos carismáticos. A maior estrela entre todos esses privilegiados é o missionário Manuel Maris dos Santos. Ele mora em São José dos Campos e, às sextas-feiras, atrai multidões à sede da igreja, para sessões de exorcismo. Transformou-se no ídolo de milhares de pessoas e no arqui-inimigo do demônio.


Seu Maverick laranja, dotado tala larga, toca-fitas e direção rally, estava na oficina para revisão geral. Por isso, o missionário chegou em casa de carona. Tinha acabado de transmitir seu programa diário, de 10 minutos, na Rádio Piratininga de São José dos Campos: Cadeia da Prece, maior audiência radiofónica do Vale do Paraíba. Era uma sexta-feira. E logo Manuel iria enfrentar o demônio. Com tranquilidade. Pois, se é verdade que o diabo já combateu, em sua existência, inimigos. piores, também é certo que o pregador não o teme.

Manuel Marins dos Santos tem uma imagem moderna, cabelo grande e paletó xadrez, fascinando suas devotas como se estivesse num auditório de TV. Uma delas rola no chão, possuída pelo demônio. Manoel lhe põe a mão sobre a cabeça e exorciza o demônio, em nome de Jesus.


Na realidade, a Igreja do Evangelho Quadrangular fundada nos Estados Unidos há 50 anos tem se espalhado por todo o Vale do Paraíba, e Manuel Maris dos Santos é o seu maior astro, com prestigio semelhante ao dos maiores cartazes da TV. Nos supermercados, cinemas e ruas, é sempre reconhecido, solicitado. Uns o chamam de pastor, outros de padre ou até mesmo de doutor. O que não constitui força de expressão: Manuel é formado em Direito pela Faculdade do Vale do Paraíba. “Não me importo que me chamem de. exorcista. Às vezes, sou isso mesmo.” Ele conta que, apesar da malicia antiga e comprovada do demônio, não tem dúvidas quando se trata de expulsá-lo do corpo dos fiéis. E nem apela para a complicada e misteriosa liturgia católica. Usa apenas o “nome de Jesus Cristo”. Uma hora antes do início da Novena Espiritual nome técnico da sessão de exorcismo das sextas-feiras Manuel já trocou de roupa. Com terno de paletó xadrez e calça cinza, ele conta como foi tocado pela Graça. Era um adolescente comum, nascido em Santa Catarina e filho de lavrador. Influenciado por amigos, passou a frequentar o templo da Igreja Quadrangular. Aos 17 anos, no dia do seu batismo, ouviu a voz que já abalara, um dia, os 12 apóstolos: “Ide e pregai o Evangelho a toda a criatura.” Manuel não resistiu à mensagem celeste. Tornou-se pregador e logo descobriu a força de sua eloquência e a incompatibilidade com o demônio. Um dia, ao colocar a mão sobre a cabeça de um fiel, este caiu no chão, em convulsões. Estava possuído pelo Inimigo do homem. Manuel pronunciou o nome de Jesus. O crente levantou-se, curado.

No corpo dessa moça de 20 anos, o demônio se manifestou com a mesma fúria que sacudiu a plateia do filme O Exorcista.
Perseguido pela invocação do pastor, o dia respondia com palavrões, negando-se a deixar seu instrumento. A moça se contorcia no solo, gritando.


As discussões do demônio com Manuel não tem aquele tom da casuístico que ficou famoso nos Evangelhos ou na literatura pia. São bate-bocas sem sutileza: “Às vezes, quando chego à igreja, nas tardes de sexta-feira, já encontro o diabo instalado no corpo de um crente. Ele começa logo a praguejar contra mim: “Lá vem esse pastor, para perturbar. Eu te mato, desgraçado. E eu respondo: “Você não perde por esperar, cachorro.” Nesta sexta-feira, talvez por causa da presença do repórter, o demônio se mostrou mais arisco. Manuel entrou no templo sem ser molestado pela implicância infernal. Não havia um único lugar na igreja: quase mil pessoas esperavam o pregador, em silêncio. No fundo do altar, um conjunto musical – duas guitarras, bateria e órgão tocava alguns sucessos do momento. O missionário Manuel entrou pela porta lateral, aproximou-se do centro do altar, tomou o microfone. O show vai começar. – Uma salva de palmas para Deus! O auditório aplaude estrepitosamente o Criador do mundo. A seguir, o público entoa canções, das quais o carro-chefe é Eu Estou Feliz, de autoria do missionário. Às sextas-feiras, além do exorcismo, há as testemunhas das curas. São convocadas ao microfone, como nos programas de TV. Uma senhora aparece com um menino e diz que a criança estava coberta de verrugas.

Ao lado do seu Maverick laranja, equipado com todo o conforto moderno, Manoel é um homem em pleno progresso material. Sua família, que costuma rezar unida, aparece na maioria dos programas da igreja Quadrangular de São José dos Campos.


Após ter trazido uma peça de roupa do doente a Novena Espiritual, as verrugas sumiram. – Uma salva de palmas para Cristo!  Pede Manuel Os novos fieis ficam, assim, sabendo que pequenas enfermidades também são curadas pela Palavra do Senhor, através de seu missionário. No fim da sessão, Manuel chama ao palco as pessoas que desejam ser exorcizadas. Ele diz que percebe com facilidade a presença do demônio: “O primeiro sintoma físico e um certo peso na nuca.” Em poucos segundos, o palco fica lotado quem tiver demônio no corpo cairá no solo, quando o missionário colocar a mão sobre sua cabeça, Um a um, Manuel vai tocando a cabeça dos fiéis. E muitos deles vão caindo, como pinos de boliche. “Eu te ordeno, em nome de Cristo, que saias deste corpo” – grita Manuel ao diabo. Apesar da familiaridade do tratamento, nem sempre a ordem é obedecida. Uma moça de 20 anos parece intensamente agarrada a sua possessão. Rola pelo chão e grita: “Eu não quero sair daqui.” Manuel tenta levanta-la do chão. Os outros exorcizados já se livraram dos seus demônios, mas a mocinha continua gritando e estrebuchando. Manuel fala mais alto e com mais autoridade. Finalmente, o diabo larga seu instrumento e a moça pode dizer o seu nome profano ao microfone. Vitorioso, Manuel pede outra salva de palmas para Jesus. E os fiéis obedecem.

Reportagem de Celso Arnaldo Araújo
Fotos de Gino Lovecchio
Revista Manchete, 1976


Traga sua história para ser contada!
Digitalização de fotos, vídeos, áudio, documentos, recortes de jornais, gravação de depoimentos, cartas, etc.
Midias Sociais: sjcantigamente
Whatsapp: (12) 99222-2255
Email: sjcantigamente@gmail.com

Comente se há informações extras, escreva suas recordações ou mesmo o que achou desta publicação. Agradeço por sua participação!